A guerra na Ucrânia: um conflito de classes

5 de Outubro, 2023
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Somos todos os dias bombardeados com notícias da Ucrânia, como está a ofensiva, quantos mísseis caíram e quantos foram intercetados, etc. Gastam-se horas a discutir quem matou Prigozhin e a transformar as pessoas em especialistas em geografia da Ucrânia, mas não se gasta um minuto para cobrir aquilo que é a situação da classe trabalhadora Ucraniana, a sua vontade para lutar contra a invasão, mas também de resistir contra as medidas do seu próprio governo.

O MAS apoia a luta contra a invasão Russa mas não damos qualquer apoio político ao governo ucraniano. Estamos com a resistência do povo trabalhador e à luta por uma Ucrânia verdadeiramente independente. O nosso foco está na emancipação nacional e na busca por uma saída em oposição aos interesses da classe dominante, das potências estrangeiras e da NATO. Consideramos que a invasão da Ucrânia é uma guerra de libertação nacional no contexto de um conflito inter-imperialista de proporções mundiais, com profundas implicações para a luta de classes. A classe dominante russa está a tentar anexar a Ucrânia como parte de seu projeto de expansão imperialista, enquanto que a classe trabalhadora ucraniana está a defender-se da invasão russa e a lutar pela sua sobrevivência.

O falecido Evgueñy Prigozhin, líder da Companhia Militar Privada “Wagner”, responsável pelo motim que expôs a fragilidade do regime ditatorial de Putin, revelou a divisão existente dentro da oligarquia, especialmente na elite militar da Rússia. Prigozhin denunciou que a guerra contra a Ucrânia foi baseada numa mentira, apontando que Ucrânia e a NATO nunca ameaçaram um ataque à Rússia. Confirmando assim aquilo que já vimos a dizer desde o início do conflito: que a invasão russa tinha exclusivamente objetivos de pilhagem e colonização.

A classe trabalhadora ucraniana tem demonstrado uma resistência heroica contra a invasão russa e a ocupação. Com a sua ação fez fracassar o plano de ocupação da Ucrânia, que Putin previa ser de 3 dias. Os trabalhadores têm sido a força motriz da mobilização popular contra a ocupação russa, reivindicando a autodeterminação do país e desempenhando um papel vital na organização de barricadas e defesas territoriais. Além disso, muitos dos trabalhadores ucranianos uniram-se às forças de resistência armada, mostrando a sua coragem e determinação.

Muitos procuram formas de auto-organização independente na luta contra a ocupação. Isso é crucial para garantir que a luta não seja cooptada por interesses burgueses ou estrangeiros. Veja-se o caso dos trabalhadores de Mariupol que, sob ocupação russa e fartos de não receber salários, lançaram convocatória de greve por tempo indeterminado a partir de 10 de setembro, dia das eleições na Rússia e nos territórios ocupados, tudo coordenado por um comité clandestino.

Mas esta mobilização também é um reflexo da luta de classes dentro da própria Ucrânia. Os trabalhadores ucranianos pagam o preço dessa guerra. Ainda assim, utilizando a justificação de ajustar a economia às exigências da guerra e aproveitando-se das condições de lei marcial, que proíbe todas as manifestações, o governo de Zelensky, que tem um amplo programa de privatizações, desmantelou as proteções trabalhistas e impôs uma série de medidas impopulares que aumentaram a degradação das condições de trabalho: redução de salário, aumento dos horários de trabalho e violação dos direitos laborais e sindicais mais elementares. Mas a classe trabalhadora ucraniana recusa-se a ser uma vítima passiva.

Em agosto do ano passado, os mineiros bloquearam as instalações da mina n.º 9 em Novovolynsk contra a decisão do governo de reconduzir gestores que tinham sido anteriormente acusados de corrupção e despedidos. Esta foi a primeira grande manifestação de trabalhadores na Ucrânia desde a invasão russa de 24 de fevereiro de 2022 e o anúncio pelo governo ucraniano da lei marcial.

Também os trabalhadores do sector da saúde têm feito campanha contra as medidas de austeridade nos hospitais e atrasos salariais, depois de as reformas orientadas para o mercado terem conduzido a encerramentos e despedimentos no ano passado, sendo muito provável que haja mais protestos se continuarem as propostas de redução de salários e do número de funcionários públicos.

A guerra na Ucrânia é uma tragédia para o povo ucraniano e uma ameaça à classe trabalhadora mundial. É um lembrete de que as classes dominantes não medirão esforços para proteger os seus interesses, mesmo que isso signifique travar uma guerra. Apoiamos o direito da Ucrânia se armar contra a agressão, mas o imperialismo está a aproveitar a ocasião para promover a militarização do mundo, servindo de pretexto para aumentar os gastos militares em todos os países, desviando recursos que deviam ser para saúde, educação, habitação e outros programas sociais para os bolsos das elites belicistas.

As classes dominantes estão a usar a guerra na Ucrânia como uma forma de dividir a classe trabalhadora. Coloca os trabalhadores da Rússia contra os trabalhadores da Ucrânia, os trabalhadores do Ocidente contra os trabalhadores do Oriente, tornando, assim, mais difícil a capacidade deles de se unirem para lutar. Ao mesmo tempo, as classes dominantes da Rússia e do Ocidente estão a usar a guerra na Ucrânia para reprimir a dissidência e silenciar a oposição. O resultado da guerra vai alterar o equilíbrio de poder entre as classes dominantes e a classe trabalhadora, isso vai ser importante para a luta de classes mundial.

Se a Rússia for vitoriosa, isso significará um revés para a luta de classes mundial. Seria um exemplo de como as classes dominantes podem usar a força militar para reprimir a luta de classes. Essa é uma das razões pelas quais a resistência ucraniana à invasão russa é determinante, porque demonstra a capacidade da classe trabalhadora de se organizar e lutar. No caso de derrota da Ucrânia, não será só território que se perderá, essa derrota ficará durante muito tempo marcada na memória da classe trabalhadora Ucraniana e de todo o mundo.

A vitória da resistência ucraniana seria um golpe significativo contra o imperialismo russo e um estímulo para a luta de classes mundial. Seria um exemplo inspirador para a classe trabalhadora em todo o mundo, demonstrando como se pode organizar e lutar contra as classes dominantes, de que é possível resistir à opressão e à exploração mesmo em face de uma força militar superior.

Por isso os trabalhadores de todo o mundo devem apoiar a resistência Ucraniana, a começar pela classe trabalhadora russa que, além de explorada por uma oligarquia com um regime ditatorial, a juventude russa está a ser enviada para morrer na Ucrânia para o benefício da classe dominante russa.

Infelizmente até este momento, a classe trabalhadora Russa não foi capaz de iniciar uma grande luta contra a guerra e a sua burguesia, no entanto, é importante reconhecer que essa força não surge de forma espontânea, ela é construída, opondo-nos à guerra imperialista, lutando pelo derrube global do sistema capitalista. É também fundamental dizer aos trabalhadores russos que desertem, que não vão lutar, que sabotem o esforço de guerra do seu país pois além de se tratar de uma guerra de agressão à Ucrânia, a classe trabalhadora em ambos os países está a ser explorada pelas suas respetivas burguesias e este conflito está a ser usado para aprofundar essa exploração.

A reconstrução da Ucrânia pós-guerra vai colocar a questão de para quem se reconstruirá o país, se para os oligarcas que fugiram para as suas residências, se para os imperialistas que vão querer cobrar o seu apoio ou se para a classe trabalhadora que deu a vida na defesa contra a invasão. Como toda a longa caminhada começa sempre pelo primeiro passo: além da solidariedade e apoio à resistência, defendemos criar pontes com as organizações de trabalhadores ucranianas levando a política de que nem Putin nem NATO, de que para defender a autodeterminação é preciso lutar por uma Ucrânia socialista.

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