Soldados israelitas admitem que receberam ordens para disparar contra palestinianos

6 de Julho, 2025
4 mins leitura

Por Miguel Ángel Hernández, dirigente do Partido Socialismo e Liberdade (PSL), secção da UIT-QI na Venezuela, e da UIT-QI

Há alguns dias, o jornal israelita Haaretz publicou uma reportagem intitulada “É um campo de extermínio”. O título foi retirado das palavras de um soldado israelita entrevistado pelo jornal, que, juntamente com outros, incluindo oficiais, afirmou ter recebido ordens para disparar deliberadamente sobre os habitantes de Gaza, desarmados, que faziam fila para receber ajuda humanitária, mesmo que não houvesse qualquer ameaça iminente ou próxima.

“Sabe-se que isto não está certo. Sentimos que não está certo – que os comandantes aqui estão a fazer justiça pelas próprias mãos. Mas Gaza é um universo paralelo. Passa-se rapidamente. A verdade é que a maioria das pessoas nem sequer pára para pensar nisso”, disse um dos soldados entrevistados pelo jornal israelita. Um outro disse: “É um campo de morte. Onde eu estava estacionado, morriam entre uma e cinco pessoas por dia. São tratados como uma força hostil – sem medidas de controlo de multidões, sem gás lacrimogéneo – apenas fogo real com tudo o que se possa imaginar: metralhadoras pesadas, lançadores de granadas, morteiros”.

Organizações não governamentais exigem a saída da GHF da Faixa de Gaza

Quase em simultâneo com as declarações dos soldados israelitas, mais de 170 organizações não governamentais que desenvolvem trabalho humanitário em Gaza emitiram uma declaração intitulada “Fome ou tiroteio – não é uma resposta humanitária”, na qual questionam a Fundação Humanitária de Gaza (Gaza Humanitarian Foundation – GHF), uma organização privada apoiada pelos EUA e por Israel, responsável pela distribuição de alimentos aos habitantes de Gaza desde maio, e apelam ao fim do programa de distribuição de alimentos da GHF. A declaração foi assinada pela Oxfam, Médicos Sem Fronteiras, Amnistia Internacional, Save the Children e muitos outros.

A 18 de março, Israel quebrou unilateralmente o cessar-fogo acordado com a resistência palestiniana em janeiro. Dias antes, tinha fechado todos os acessos à Faixa de Gaza, submetendo a sua população a um bloqueio brutal que durou mais de dois meses, impedindo a entrada de alimentos, medicamentos e combustível, com o objetivo deliberado de matar à fome os habitantes de Gaza, quebrar a resistência e fazer avançar o seu plano estratégico de limpeza étnica para estabelecer o Grande Israel, uma ideia publicamente apoiada pelo ultra-direitista Donald Trump.

Neste contexto, e face às crescentes mobilizações em todo o mundo, incluindo no próprio Israel, bem como às pressões hipócritas de vários governos europeus, os EUA e Israel concordaram em criar um novo programa de distribuição de ajuda humanitária, gerido por uma organização privada, a GHF, que funcionaria sob o controlo do exército israelita.

A GHF iniciou as suas actividades a 26 de maio e, desde então, os pontos de distribuição de ajuda tornaram-se campos de morte. 549 pessoas foram mortas nestes centros e mais de 4.000 ficaram feridas. De acordo com a declaração das ONG’s, em mais de metade dos ataques a civis nos locais de distribuição de alimentos, foram feridas crianças.

O documento das ONG’s refere que os 400 pontos de distribuição de ajuda que funcionavam durante o cessar-fogo foram substituídos no novo sistema apoiado por Israel e pelos EUA por apenas quatro pontos de distribuição controlados pelo exército israelita: três no extremo sudoeste de Gaza e um no centro do enclave.

A exigência das ONG’s e o que os soldados israelitas disseram ao Haaretz apenas confirmam o que já é do conhecimento geral: Israel mata deliberadamente os palestinianos que se dirigem aos centros de distribuição de ajuda humanitária para recolher alimentos. Não se trata de ‘erros’ ou de actos aleatórios. Trata-se de uma política consciente de extermínio do povo palestiniano em Gaza, que também é levada a cabo, em menor escala, na Cisjordânia ocupada.

Mais de 100.000 mortos na Faixa de Gaza

Anteriormente, os habitantes de Gaza tinham sido sujeitos a um bloqueio brutal que impedia a entrada de alimentos e medicamentos. Israel utilizava assim a fome como arma de guerra. Todos estes são meios diferentes para implementar a limpeza étnica que o sionismo vem realizando na Palestina há 77 anos e que, desde outubro de 2023, se intensificou, expressando-se num verdadeiro genocídio, dramaticamente evidenciado num estudo recente numa pesquisa independente sobre o número de mortos em Gaza, liderada por Michel Spagat, do Royal Holloway College, Universidade de Londres, segundo o qual o número de pessoas mortas por Israel em Gaza seria muito maior do que os números oficiais divulgados pelo Hamas.

De acordo com este estudo, mais de 80.000 pessoas foram mortas entre outubro de 2023 e janeiro deste ano. Cerca de 75.200 palestinianos morreram diretamente e 8.540 de fome e doenças relacionadas com a guerra. Ou seja, um em cada quatro palestinianos que vivem na Faixa de Gaza. O mesmo estudo estima que o número de pessoas mortas atualmente é de aproximadamente 100.000.

Continuamos a insistir na mobilização mundial contra o genocídio

A partir da Unidade Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI), continuamos a dar todo o nosso apoio ao heroico povo palestiniano, e apelamos ao aprofundamento das mobilizações em todo o mundo contra o genocídio e a tentativa do criminoso Netanyahu de avançar com a limpeza étnica defendida pelo seu aliado de extrema-direita Donald Trump.

Os governos e monarquias árabes e do Médio Oriente, com exceção do regime Houthi no Iémen, nada fazem para apoiar a luta do povo palestiniano, limitando-se a declarações tépidas, quando deveriam apoiar as organizações da resistência com armas e todo o tipo de recursos, bem como romper todas as relações com Israel.

Exigimos um cessar-fogo imediato, a retirada de todas as tropas israelitas e o respeito pela integridade de Gaza como parte da Palestina; bem como a libertação imediata de todos os postos fronteiriços para assegurar a entrada de alimentos, medicamentos, combustível e água, e o restabelecimento imediato da eletricidade. Exigimos a retirada imediata das forças israelitas dos Montes Golã e de outras zonas da Síria. Rejeitamos a detenção ilegal e a ameaça de deportação de activistas que defendem a liberdade da Palestina e de Gaza, como tem acontecido nos Estados Unidos, Alemanha, França, Argentina e outros países. Romper relações políticas diplomáticas, comerciais, culturais e académicas com Israel. Por uma Palestina única, laica, democrática e não racista: Palestina livre do rio ao mar!

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