Estudantes da Argentina na luta pela defesa do ensino público

Argentina: Após mobilização massiva, a luta deve continuar

15 de Outubro, 2024
4 mins leitura

Por Izquierda Socialista, secção argentina da UIT-QI

No dia 2 de outubro realizou-se mais uma mobilização histórica em defesa da universidade pública na Argentina, que inundou as ruas do centro de Buenos Aires e as principais praças do país. De Tierra del Fuego a Jujuy, mais de um milhão de pessoas manifestaram a sua oposição às políticas anti-educação de Javier Milei e ao seu veto à Lei de Financiamento das Universidades, recordando que a enorme manifestação de 23 de abril já o tinha atingido duramente. Não há dúvida de que, por detrás deste movimento massivo em defesa da universidade pública, esteve também o enorme mal-estar causado pela inflação, pelos baixos salários, pela pobreza crescente e pelo colapso das expectativas, provocando mais um duro revés no plano repressivo e de “motosserra” de Milei, dos governadores e do FMI. 

Na semana anterior a este protesto, foram divulgados dados chocantes do Indec: a pobreza subiu para 52,9% e a indigência para 18,1%, com 66% das crianças com menos de catorze anos a afundarem-se na pobreza, uma verdadeira catástrofe social. Neste contexto, a imagem de Milei e da sua irmã Karina (com o seu novo cão) a serem fotografados na Casa do Governo com Susana Giménez, no preciso momento em que estes números foram tornados públicos, foi obscena. Mais um capítulo provocatório a juntar à foto do presidente a festejar o veto aos reformados com um churrasco em Olivos (Buenos Aires).

Nada disto sai grátis a Milei. As sondagens de um vasto leque de fontes concordam que a imagem do Presidente está a cair rapidamente e que a raiva contra as medidas de austeridade está a crescer. Um sinal já tinha sido o “apagão” da emissão televisiva nacional de domingo, em que Milei apresentou o Orçamento 2025 no Congresso. Depois, houve o seu minúsculo ato sem brilho no anfiteatro do Parque Lezama, onde mal conseguiu reunir 3.000 pessoas, muitas delas trazidas em autocarros alugados ao melhor estilo da casta, mostrando um claro fracasso do lançamento de La Libertad Avanza como partido nacional.

Ou Milei não regista o crescimento da raiva (embora seja impossível, porque todas as sondagens o dizem) ou talvez ainda esteja confiante de que as suas mentiras podem neutralizá-la. Por exemplo, dizer que a marcha de 2 de outubro “foi política” e que os estudantes se deixaram conduzir como marionetas pela mão de políticos da oposição patronal trata-se de um claro erro de quem aposta que, com um discurso grotesco, misógino e autoritário, criticando o jornalismo ou a “casta” banal, pode obter resultados. É por isso que milhares de pessoas começam a dizer publicamente que se arrependem de ter votado nele.

O delírio de Milei chega a tal ponto que, no comunicado que emitiu a propósito da marcha, fala de Cristina Kirchner, Martín Lousteau, Sergio Massa, Horacio Rodríguez Larreta e Elisa Carrió quererem formar uma “frente populista de esquerda” para obstruir o seu plano económico. Hilariante. Milei acredita provavelmente que pode repetir, no Congresso, com a cumplicidade dos “87 heróis”, o veto à lei de financiamento das universidades. Mas resta saber se vai ser mesmo assim. Ou se a trégua que os burocratas sindicais da CGT lhe estão a dar poderá continuar a abrir caminho a uma sólida colaboração de “governabilidade” para levar até ao fim o seu brutal “plano motosserra”. 

Mas, apesar de tudo isto, a mobilização de quarta-feira, dia 2, foi extraordinária em todo o país. Esta é a realidade. As sondagens e a agitação social, tão incómodas para o leão libertário, começam, pela primeira vez, a apontar-lhe o dedo como responsável pelos males actuais. A multidão nas ruas nesta quarta-feira reeditou o filme que foi vivido no primeiro semestre, onde milhões de nós ganhamos as ruas enfrentando a DNU e a Lei Omnibus, que no final acabou por cair. Esse é o caminho a seguir. Por isso é tão repudiável que, após a bem sucedida segunda greve geral de 9 de maio, a CGT tenha entrado em trégua com o governo, negociando a regulamentação da reforma trabalhista, com a pérfida política de fazer crer que o governo deve ouvir e mudar.  

A reunião desta segunda-feira da CGT com o governo foi um passo nesse sentido. A tal ponto que o burocrata Fernandez, da UTA, disse que “era contra” a possível greve dos transportes anunciada para 17 de outubro. Os trabalhadores precisam de algo mais. Assim o entendem os reformados, que continuam a mobilizar-se às quartas-feiras; os trabalhadores da Aerolíneas, que lutam duramente pelos seus salários e contra a privatização; o pessoal do Hospital de Garrahan que, com as suas enérgicas greves, conquistou um bónus de 500.000 pesos; os professores, que se têm levantado nalgumas províncias, como em La Rioja; entre outras lutas em curso, coroadas pela tremenda mobilização universitária. 

O apoio e a coordenação dessas lutas são fundamentais para o seu sucesso. Em primeiro lugar, é preciso manter uma mobilização permanente contra o veto de Milei, para conseguir que o Congresso ratifique o projeto de lei de financiamento das universidades. E, a partir de cada luta, repudiar a trégua da CGT, exigindo que, junto com as CTAs, convoque uma nova greve geral e um plano nacional de luta para deter e derrotar o plano motosserra de Milei. Uma tarefa que, para a Izquierda Socialista, vai de mãos dadas com a luta para impor outro plano económico, operário e popular, que começa com o não pagamento da dívida externa. Chamando a tudo isso para fortalecer a Frente de Izquierda y de Trabajadores – Unidad, única alternativa política dos trabalhadores e da juventude, contra Milei e todos os que nos têm governado até agora.

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